A Depravação Total
- Fernando San Gregorio
- 11 de jul. de 2022
- 7 min de leitura

Depravação total ou corrupção total são termos intercambiáveis e estão diretamente relacionados ao pecado original, designação dada ao pecado de nossos pais Adão e Eva. Se diz, portanto, da origem, influência e consequência da desobediência nefasta no jardim edênico. A origem vai apontar diretamente a causa da queda se proveniente do próprio Deus como decreto proposto, se procedente do homem mesmo dado sua liberdade, ligando grande parte da problemática do pecado ao mal uso que o homem fez do livre arbítrio.
A influência aponta para o aspecto no que diz respeito à força onde o homem após a queda estaria sujeito, portanto, um domínio sobre a vontade humana e persuasão em todas as esferas deste, quanto a consequência foca diretamente no resultado produzido pela queda a saber o pecado original. Segundo Stanley Horton “Por estar à natureza humana tão deteriorada pela queda, pessoa alguma tem a capacidade de fazer o que é espiritualmente bom sem a ajuda graciosa de Deus. A esta condição chamamos corrupção total ou depravação da natureza.” (HORTON, 1996).
A discussão em torno deste tema está intrinsecamente relacionada com a posição em que se entende o pecado original. Podemos definir de forma negativa depravação total, mostrando primariamente o que ela não é, que o homem não é tão mal como poderia ser, que as pessoas não podem fazer coisas boas, que as pessoas não têm consciência de Deus. Significa que o pecado de Adão atingiu a todos e a cada um dos homens, também que os homens não regenerados são totalmente depravados no sentido extensivo a saber que todas as áreas da sua vida foram atingidas pelo pecado de Adão.
A Posição de Pelágio sobre o Pecado
Pelágio nasceu em 354 d.C. a data de sua morte é desconhecida, tornou-se monge, morou em Roma, no entanto, não sabemos muito sobre sua biografia, não obstante, o que conhecemos a despeito de sua doutrina o temos pelas fontes secundárias como Agostinho de Hipona e Jerônimo.
Pelágio entendia que o pecado de Adão não teria afetado a natureza humana, portanto, não o temos por herança ou imputação de sua transgressão, o pecado seria tão somente um elemento de cunho moral, onde o homem pelo exemplo aprende a fazer o que não apetece. O homem nasce bom e não herda a natureza corrompida proveniente de Adão, outro sim, o pecado ofende apenas o mérito do homem, podendo este por sua própria vontade alcançar êxito diante de Deus, Pelágio entendia que a fraqueza da carne era meramente um pretexto para justificar ações imorais.
A controvérsia pelagiana movimentou os líderes eclesiásticos de seu tempo dado que sua compreensão atingia pontos essenciais da doutrina cristã, como consequência lógica de seus ensinamentos negar a imputação do pecado de Adão certamente acarretaria numa negação da imputação da justiça de Cristo, vale destacar a polêmica do batismo infantil onde uma vez considerado a impecabilidade da criança até que possa ser responsável por seus atos não seriam então necessário para o infante o batismo para “remissão dos pecados”, esta controvérsia surgiu em meados de 411 d.C. quando Celestius um de seus discípulos ansiava pelo presbitério em Cartago. Suas doutrinas foram condenadas no concílio de Cartago em 418 d.C. levando-o ao exílio em Constantinopla no ano de 429 d.C.
A Posição de Cassiano sobre o Pecado (Semipelagiano)
João Cassiano (360 d.C.- 435 d.C.), fundou o mosteiro de Marselha no ano de 410 d.C. e estabeleceu sua posição entre o sinergismo radical de Pelágio e o monergismo professado principalmente nas últimas obras de Agostinho o bispo de Hipona. Cassiano no que lhe concerne não considerava a natureza humana como plenamente saudável, mas entendia como que apenas enferma. Stanley Horton aponta “O semipelagianismo sustenta que, embora a humanidade tenha se enfraquecido com a natureza de Adão, sobrou livre-arbítrio suficiente para a iniciativa de ter fé em Deus(...).” ainda, “(…) ensina que, embora
a natureza humana esteja tão enfraquecida pela Queda, a ponto de ser inevitável que as pessoas pequem, a bondade inerente que possuem é suficiente para iniciar a verdadeira fé.” (HORTON, 1996). João Cassiano entende que a despeito da queda e da transmissão do pecado de Adão o homem pode levantar-se e percorrer seu caminho em direção a Deus.
A posição de Armínio sobre o Pecado
Jacó Armínio pastor e teólogo holandês (1560 d.C. - 1609 d.C.) entendia que o homem está morto em seus delitos e pecados, portanto não pode se posicionar ante Deus, mas através da mensagem do evangelho que é a graça manifesta, possibilitando ao homem que tenha um posicionamento positivo diante da Graça que lhe é oferecida. O termo mais utilizado por Armínio em suas obras são, corrupção total, pecado original e incapacidade. Em Armino a imagem de Deus fora corrompida, mas não completamente perdida, com John Wesley podemos ter uma ideia sistemática de seu posicionamento.
No que concerne a imagem de Deus pode-se classificá-las em três níveis distintos, primeiro o homem natural como imagem de Deus, esta natureza está correlacionada com as decisões da vida comum, toda categoria de decisão subscrita a vida do homem. Segundo o homem político se refere tão somente ao relacionamento que o homem tem com Deus, com a natureza, consigo mesmo e com o próximo e por fim a imagem moral que diz respeito aos atributos espirituais da pessoa humana e sua capacidade de buscar a Deus, quanto aos dois primeiros está "imagem" está corrompida, quanto ao último está "imagem" fora perdida mostrando por tanto a incapacidade de todo ser humano alcançar a Deus.
Armínio, portanto, tem uma antropologia pessimista no que concerne a vontade do homem, onde esta vontade após a queda está escravizada pelo pecado, podemos então relacionar o livre arbítrio do homem a um arbítrio liberto. Segundo Roger E. Olson citando Armínio “a graça liberta a vontade da escravidão do pecado e ao mal e lhe da habilidade de cooperar com a graça salvífica e não lhe resistir” (OLSON, 2013).
Arminianismo
Como podemos perceber há diferentes escolas de pensamento no que tange a teologia, mas especificamente conforme nosso estudo, no que diz respeito a “hamartiologia” doutrina do pecado e “soteriologia” doutrina da salvação. No decorrer da história houve mitos e distorções no que diz respeito a doutrina arminiana principalmente em sua soteriologia. Ora por classificá-lo como defensor das ideias de Pelágio, em outros momentos o de identificá-lo com o semipelagianismo, principalmente apos o concílio de Dort, com a derrota dos remostrantes, representantes das principais teses de Armínio houve um pensamento hegemônico de recusa a teologia de Armínio.
Algumas acusações da escola calvinista distorcem o arminianismo como Edwin H. Palmer que diz que os arminianos insistem em roubar a glória de Deus dando gloria somente ao homem, dando tamanha enfase na vontade humana a ponto de não mais necessitar da graça. Mas vejamos Armínio conforme a declaração de sentimentos, Roger E. Olson em sua obra teologia arminiana mitos e realidades descreve “Em seu estado pecaminoso e caído, o homem não é capaz de e por si mesmo, quer seja pensar, querer ou fazer o que é de fato bom…”(OLSON, 2013) em outra declaração “Eu atribuo à graça o começo, a continuidade e a consumação de todo bem”(OLSON, 2013). Na sequência “O livre arbítrio é incapaz de iniciar ou de aperfeiçoar qualquer verdade, ou bem espiritual sem a graça”(OLSON, 2013)
Para Armínio a depravação humana se dá devido ao primeiro pecado e jamais deveríamos imputar a Deus tais alegações, distanciando-o de figuras como Pelágio e Cassiano. A Vontade humana está cativa ao pecado e é incapaz de um ato espiritual bom por si mesmo, esta vontade não possui mérito por obras, sua operação não é meritória ela alcança a graça porque está aconteceu na morte expiatória de Cristo, somente o arbítrio sem o objeto em que ela se dirige, ficaria na inércia, o mérito e tão somente de Nosso Senhor Jesus Cristo que quebrou as amarras do pecado por toda eternidade, a Graça vem primeiro, ela liberta o arbítrio para poder escolher ela mesmo a Graça. Em Armínio teremos uma forte teologia da Graça, não dada por mérito humano, mas sim pela eficácia da obra redentora de Jesus Cristo.
Com pelágio temos a força da vontade humana que se basta a si mesma para superar seus vícios e suas mazelas e alcançar o favor de Deus, para o semipelagianismo ainda que esta vontade esteja “enferma” ela pode levantar-se e reconduzir seu caminho para Deus para que a partir de então Deus o conduza com sua graça, com Armínio está graça é preveniente condição “sine qua non” para que o homem possa uma vez liberto do pecado produzir uma boa obra.
A Graça promove e sustenta a salvação dos homens. Armínio da ênfase a Graça como elemento único para salvação em detrimento da vontade humana, pare ele, segundo Roger E. Oson “nenhuma pessoa pode sequer desejar a Deus sem a atuação da Graça.”(OLSON, 2013). Para Armínio o foco não era a origem da salvação tão somente pela Graça, mas se está era irresistível.
Considerações Finais
A história está sendo resgatada por estudiosos competentes, apontando falácias levantadas contra a pessoa e a teologia de Armínio, também temos um movimento de aprofundamento nos estudos deste autor tão importante, seu verdadeiro pensamento sobre a doutrina do pecado, sobre a doutrina da salvação que muito podem contribuir para o amadurecimento da teologia de nosso país, ainda há muito para desvelarmos, muito trabalho a ser feito para um sistema eficaz que contribua para o desenvolvimento dos santos.
Conforme diz o próprio Jaco Armínio “...todas as outras ciências têm seu objeto, realmente nobres, e digno de envolver a mente humana...”, “... Mas o próprio Deus é objeto da teologia”.
Bibliografia
ARMINIANA, T. Pelagianismo e Semi-Pelagianismo - Dr. Ivan de Oliveira. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=fMiSmgUtMx8>. Acesso em: 21 jun. 2022.
ARMINIANA, T. Depravação Total e Eleição Incondicional - Pr. Vinícius Couto. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=v3NPXoTnlAo>. Acesso em: 24 jun. 2022a.
ARMINIANA, T. Depravação Total - Pr. Vinicius Couto. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=wZKy0vWGeTE>. Acesso em: 21 jun. 2022b.
HORTON, S. M. Teologia Sistemática uma Perspectiva Pentecostal. Rio de janeiro: Casa Publicadora das Assembleias de Deus, 1996.
OLSON, R. E. Teologia Arminiana Mitos e Realidades. São Paulo: Reflexão, 2013.
SPROUL, R. C. Sola Gratia. São Paulo: Cultura Cristã, 2019.
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